Crítica + Bate-Papo: Riscado

Ficha Técnica

Direção: Gustavo Pizzi
Roteiro: Gustavo Pizzi e Karine Teles
Elenco: Karine Teles, Camilo Pellegrini, Otávio Muller, Dany Roland, Lucas Gouvêa, Patricia Pinho, Cecília Hoeltz, Otto Jr., Gisele Fróes
Fotografia: Paulo F. Camacho
Música: Lucas Vasconcellos, Iky Castilho e Letícia Novaes
Direção de arte: Fernanda Teixeira
Figurino: Fabíola Trinca
Edição: Gustavo Pizzi e Paulo F. Camacho
Produção: Cavi Borges e Gustavo Pizzi
Duração: 85 minutos
País: Brasil
Ano: 2010
COTAÇÃO: EXCELENTE




A opinião


Realizada durante o Festival do Rio 2010.

“Riscado” é um filme que precisa ser assistido de dentro para fora. A narrativa objetiva isso: a introspecção realista, o saudosismo e a esperança passional e ingênua da personagem principal, que busca ser alguém no papel da vida que escolheu: ser atriz, criando a metalinguagem da interpretação do que se é e do que se pretende ser. Os balões vermelhos por uma bailarina em uma repartição pública podem ser entendidas como a metáfora do aprisionamento da estabilidade profissional. A câmera busca a nostalgia de um carnaval antigo fora de época, com fotografia saturada às cores de uma fantasia típica deste meio. A trilha sonora é intimista. Com imagens de 16 mm (utilizando um filme gasto) lembra as de 8 mm. Capta-se a essência de se sobreviver pela escolha que se faz. A personagem tem o sonho de ser uma atriz, então batalha realizando trabalhos diversos: imitando personagens famosos do cinema, trabalhando como cantora em um salão de cabeleireiro e entregando panfletos de uma festa à fantasia. Qual a importância da sorte na vida? Quanto esforço e talento são necessários para garantir uma carreira sólida? A sorte é parte do riscado? Bianca é uma excelente atriz, mas sua carreira ainda não deslanchou. Como ganha-pão, ela imita divas do cinema e trabalha divulgando eventos. Após fazer um teste para uma grande produção internacional, Bianca finalmente ganha o papel. Inspirado pela personalidade e o trabalho dela, o diretor do filme transforma a personagem do seu roteiro, em uma versão da própria Bianca, que será uma das protagonistas. Essa é a grande chance de sua vida?

Karine Teles, que vive a protagonista, é sensacional. Com seus olhos verdes seguros e decididos, que almejam o resultado pela luta constante do ganha pão diário, ela arrebata e aprisiona o espectador em sua interpretação visceral, contida, sutil e apaixonante. A parte técnica é outro elemento extremamente competente. Enquadramentos rápidos, pouco convencionais, que buscam o close e a cumplicidade de quem está do outro lado da tela, quando o olhar da personagem foca na câmera, enquanto fuma um cigarro. As dificuldades da sua trajetória são demonstradas por sutilezas: comendo uma coxinha ou um cachorro-quente ao final do trabalho e a troca de roupa esperando o ônibus. Ha naturalidade. Ela não desiste dos sonhos. Participa de um teste de elenco, utilizando a própria vida para improvisar em um papel. “Quero fazer um filme para enterrar o morto que a gente carrega”, diz-se. Há poesia lúdica quando apenas a luz das velas de um bolo mostra as suas expressões faciais. Não querendo ser repetitivo, mas sabendo que estou sendo, digo que Karine é uma excelente atriz (a real).

Há julgamentos em críticas, quando a locatária dá sermão por causa da escolha desta profissão. Aos poucos, os seus quereres abstratos tornam-se mais próximos do concreto. O foco e o fora de foco despertam a entrega total do espectador, fazendo com que ele pense na própria vida, despertando a possibilidade de reviver sonhos perdidos e passados ou atuais e atuantes. O sol (com uma luz alaranjada) participa como um inicio de uma musica de jazz. É um filme sobre crescimento, sobre a luta do que se quer. A não estabilizar na mesmice e no medo que pulula a vontade real de cada um. “Ter grana para um táxi”, diz-se. São desejos simples projetados para um futuro colado ao presente. A peça filmada faz da vida imitando a arte dentro da arte. Há frustração quando se aposta todas as fichas em um só lugar. O filme, de um lirismo moderno e não sentimental, trabalha a emoção sem o clichê e sem óbvio. É excelente, principalmente porque não se pretende ser nada, apenas deixar acontecer a história. Sem correria, sem pressa, com ou sem choro. Vale à pena. Recomedadíssimo.

Confira o Bate-Papo com a atriz Karine Teles e com o diretor Gustavo Pizzi




O Diretor


Gustavo Pizzi. Nasceu em Petrópolis, interior do Rio de Janeiro, em 1977. Estudou na UFF e trabalha com cinema desde 1996. Entre muitos outros, é produtor dos curtas premiados "Sete Minutos" e "A Distração de Ivan". Também é produtor e montador do documentário "L.A.P.A.". Em 2006, dirigiu seu primeiro filme de longa-metragem, o documentário "Pretérito Perfeito". Riscado é seu primeiro longa de ficção.